Paula Regina Silva Gomide
Paula Regina Silva Gomide é médica veterinária formada pela Unesp – Botucatu, com residência em Cirurgia de Pequenos Animais. Na mesma instituição, fez mestrado e doutorado em Cirurgia Veterinária pela Unesp – Jaboticabal. Atua como cirurgiã geral e ortopédica na Clínica Dr. Niva e Cia, em Itu.
Nesta entrevista, conversamos sobre a campanha Fevereiro Roxo, que visa alertar a prevenção de doenças em animais idosos e doenças degenerativas.
Revista My Pet – A partir de que idade, podemos considerar um animal de estimação idoso?
Dra. Paula – Isso depende muito do porte físico do animal. Em teoria, os animais são considerados idosos quando atingem 75% de sua expectativa de vida. Nos cães de pequeno porte isso equivale a aproximadamente 9 anos de idade, enquanto nos cães de porte grande, 7 anos. Já os gatos são considerados idosos quando atingem 11 anos de idade.
My Pet – Quais características físicas e comportamentos podem exemplificar sua idade?
Dra. Paula – Alguns cães podem apresentar alterações nos pelos, tanto na coloração como na estrutura, principalmente em região de face. Os pelos ficam grisalhos, com uma textura mais fina, quebradiça e sem brilho. A pele também fica com uma aparência mais delgada.
Alterações de comportamento também são observadas nesses animais, e o que mais chama atenção é a quantidade de horas que o animal idoso passa dormindo, uivos e latidos noturnos e desorientação.
My Pet – Quais doenças são mais comuns surgirem nessa faixa etária?
Dra. Paula – Uma doença muito comum no envelhecimento dos animais nas mais diversas espécies é a doença periodontal, em que o tutor perceberá mau hálito, perda de dentes, gengivite e dificuldade de mastigação, que contribuirão para que o animal deixe de comer alimentos secos e dê preferência para alimentos pastosos.
A dificuldade de mobilidade é encontrada em praticamente todos os animais idosos e está relacionada basicamente a osteoartrose, que pode estar instalada tanto nas articulações do esqueleto apendicular, ou seja, dos membros torácicos e pélvicos, quanto no esqueleto axial, que é representado pela coluna vertebral, nesses casos. Além disso, há a perda de musculatura, que acontece pelo catabolismo e diminuição da atividade física. Nos gatos, é percebido uma diminuição da atividade rotineira de saltos. Esses animais deixam de subir em locais que, quando mais jovens, costumavam explorar ou apenas deitar e descansar.
Algumas doenças oftálmicas, como a catarata, glaucoma e a esclerose nuclear são muito comuns nesta fase da vida dos animais. Alguns cães podem até chegar a perder a visão, e com isso demonstrarem um comportamento alterado, podendo ser confundido com disfunção cognitiva, pois esses animais podem se sentir perdidos, apresentarem um andar mais lento e com marcha alterada. Ainda é bastante comum a perda da audição. Nos gatos é menos comum alterações de visão decorrentes da idade.
A obesidade pode ser encontrada em animais idosos, principalmente nos cães, já que os gatos costumam apresentar caquexia relacionada à idade por decorrência de doenças metabólicas e renais.
Por fim, as doenças renais crônicas e as neoplasias em geral fazem parte da vida senil tanto dos cães quanto dos gatos.
My Pet – De modo geral, há alguma forma de preveni-las? Em caso afirmativo, de que forma?
Dra. Paula – Sim. Levando o animal regularmente ao veterinário, para que exames de check-up sejam feitos e, dessa forma, caso já se observe alguma alteração, iniciar o tratamento de forma precoce, melhorando o prognóstico e a sobrevida do animal. Além disso, é importante manter uma boa alimentação, com alimentos de boa qualidade nutricional, pode ser feita a suplementação com vitaminas específicas para idosos, deve-se manter a atividade física do animal, com passeios e brincadeiras, manter o protocolo vacinal em dia e viver em um ambiente limpo e feliz.
My Pet – Existem alimentos que devem ser retirados ou substituídos quando estão idosos?
Dra. Paula – Depende. Se o animal sempre teve uma alimentação saudável, com petiscos recomendados pelo veterinário e que fazem parte da dieta daquele paciente em específico, não. Somente utilizar ração para animal idoso, se esse for o caso. Mas, se é um animal que sempre teve acesso a petiscos que não são específicos da espécie ou são de má qualidade nutricional, esse animal se apresenta acima ou abaixo do peso, sim. Nesses casos, deve ser ajustada a quantidade de alimento fornecido diariamente e substituídos os petiscos não saudáveis pelos saudáveis. Ainda, se há necessidade de perda ou ganho de peso, o ideal é que seja agendada uma consulta com um especialista da área de nutrição para que todas as necessidades nutricionais sejam atendidas e se obtenha o resultado esperado.
My Pet – As doenças neurodegenerativas surgem somente em animais idosos? Estão relacionadas a idade?
Dra. Paula – De modo geral sim.
My Pet – Quais são as principais e sintomas que os animais manifestarão?
Dra. Paula – Falarei sobre quatro. São elas:
– Síndrome da cauda equina: a síndrome da cauda equina ou estenose lombossacra é mais comum nos cães e consiste em um transtorno degenerativo provocado por diversas causas, onde a articulação lombossacra sofre um estreitamento causando compressão nas raízes nervosas da região final da medula espinhal, que normalmente cursa com artrose e espondilose nas vértebras L7 e S1. Acomete principalmente os cães de grande porte e os principais sintomas estão relacionados à dor na região lombossacra, portanto o animal evita exercícios, saltos e movimentos bruscos de sentar e levantar, podem apresentar dificuldade em realizar a posição de defecação e de micção, além de andar rígido, podendo apresentar claudicação de um ou ambos membros pélvicos. Ao primeiro sinal, esse animal deve ser avaliado por um veterinário, uma vez que essa doença tem caráter progressivo, podendo causar incontinência urinária e fecal.
– Envelhecimento cerebral canino: consiste em uma desordem neurodegenerativa que acomete cães com idade superior a 8 anos, provocando alterações nas suas funções cerebrais. O que acontece nesses casos é que o tecido cerebral dos cães sofre uma deterioração com o passar dos anos. São produzidos radicais livres que irão promover a oxidação do tecido neuronal cerebral. Os sintomas percebidos com o envelhecimento cerebral canino são alterações de comportamento, desorientação, alterações no sono, aumento da irritabilidade e agressividade.
– Síndrome disfunção cognitiva: a síndrome de disfunção cognitiva, também chamada de Alzheimer canino, afeta cães idosos independente do porte e da raça do animal. É uma doença neurodegenerativa progressiva, assim como o envelhecimento cerebral canino, que afeta várias funções do sistema nervoso dos cães, trazendo alterações de memória, aprendizado, consciência e de percepção do meio ambiente. É frequente observar alterações comportamentais em que o animal caminha sem rumo pela casa, vocaliza sem motivo aparente e para com olhar fixo e vago. Podem ter o apetite alterado, aumentando ou diminuindo a ingestão de comida. Também é notado um aumento na quantidade de horas de sono do animal, principalmente durante o dia. Podem demonstrar esquecimentos, como por exemplo não reconhecer os donos, não encontrar o pote de comida e de água e ainda podem se mostrar desorientados e perdidos, com fisionomia de ansiedade e medo.
– Hérnia de disco: a hérnia de disco ou doença do disco intervertebral é caracterizada pela degeneração do disco que fica entre as vértebras da coluna, resultando em vários graus de comprometimento da medula espinhal. Existem ao todo 8 tipos de hérnia de disco em cães. Os sintomas mais comumente encontrados em cães com hérnia de disco são dor a palpação da coluna, movimentos mais lentos, dificuldade de sentar e levantar, falta de coordenação motora, dificuldade em manter o equilíbrio, postura cifótica, alteração do tônus muscular dos membros, diminuição da força, perda da propriocepção e até perda de movimento.
My Pet – Existem raças ou espécies que mais são acometidas por essas doenças?
Dra. Paula – Os cães são mais frequentemente acometidos pelas doenças neurodegenerativas quando comparados aos gatos. Em relação às doenças do disco intervertebral os cães condrodistróficos, como o Dachshund, Bulldog Francês, Shih Tzu, Lhasa Apso, dentre outros, são os mais acometidos. Quando se trata da síndrome compressiva da cauda equina os cães pastores, como o Pastor Alemão, Pastor Maremano, Pastor Belga são os mais acometidos, seguidos de outras raças de grande porte, como Labradores, Rottweilers, Golden Retriever e Bernese Mountain Dog. Já as doenças com acometimento cerebral são mais comuns em cães de pequeno porte como Poodle, Pinscher, Maltês e Yorkshire.
My Pet – Qual a importância do acompanhamento veterinário para animais idosos?
Dra. Paula – O acompanhamento periódico do animal idoso pelo veterinário é fundamental para proporcionar uma boa qualidade de vida e um envelhecimento saudável, além de permitir a identificação precoce de doenças e assim possibilitar condutas terapêuticas que irão colaborar para o aumento da sobrevida. Com a idade, os animais ficam mais frágeis e debilitados e precisam de mais atenção do tutor, bem como de cuidados veterinários.
My Pet – Tenho um animal com esse tipo de doença, se falarmos do espaço físico onde vive, que conselhos daria para melhor acolhê-lo?
Dra. Paula – Quando falamos nas doenças de acometimento cerebral é importante que esses animais não sejam realocados de ambientes, não tenham acesso a escadas, a rua, degraus altos, ou locais que possam ficar presos ou confusos. Ainda, deve-se atentar a deixar pote com água sempre próximo do local onde o animal permanece. Já em relação às doenças que acometem a coluna é fundamental que esse animal não fique em piso liso, não tenha que subir e descer escadas, sofás ou camas e que não fique solto em grandes espaços, como chácaras, sítios, fazendas, ou ainda, quintais grandes.
My Pet – Quanto aos tratamentos para essas doenças, houve ou está ocorrendo algum tipo de evolução nos últimos anos? Nossos animais poderão viver mais futuramente?
Dra. Paula – Sim, com certeza. A medicina veterinária está em constante evolução e muita coisa mudou nos últimos 10 anos. Hoje em dia, o veterinário que não se atualiza pelo menos a cada dois anos, está sendo deixado para trás. A tecnologia propiciou a descoberta de novas doenças, mas também da sua causa e, por conseguinte, o tratamento. É verdade que muitas delas não possuem cura e ainda não se sabe como fazer a prevenção, assim como na medicina, mas com os novos estudos, é possível garantir qualidade de vida aos animais idosos. Novos fármacos, novos protocolos terapêuticos e novas técnicas cirúrgicas vêm sendo grandes aliados para o bem-estar do animal idoso.
Quanto à questão da sobrevida animal, acredito que chegamos num ponto que será difícil de ultrapassar, uma vez que encontramos gatos vivendo até 25 anos e cães já ultrapassando os 17 anos. Não podemos esquecer, porém, da individualidade de cada animal. O cão mais velho do mundo viveu 29 anos, mas não acho que seja uma realidade da maioria dos animais mesmo com todos os cuidados do tutor e do veterinário. Hoje em dia, conseguimos que cães cheguem aos seus 17 anos e os gatos aos seus 25 anos apresentando qualidade de vida, de forma mais frequente.
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